Governo estuda cortar 48% do repasse para o Inpe e pode zerar verba para novas pesquisas espaciais
Tabela com o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) obtida pela reportagem mostra que o montante desejado pelo Inpe para manter o Programa Espacial Brasileiro seria de R$ 78 milhões, porém, a agência prevê o repasse de R$ 32,7 milhões. Corte é de 48,5%.
A Agência Espacial Brasileira (AEB) estuda um corte de 48,5% no repasse de recursos destinados ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) em 2021. Pesquisadores afirmam que o corte implica em zerar verba para novas pesquisas.
Uma tabela da AEB com o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) obtida pela reportagem, mostra que o montante desejado pelo Inpe para manter o Programa Espacial Brasileiro seria de R$ 78 milhões, porém, a agência prevê o repasse de R$ 32,7 milhões. A existência da planilha foi revelada pela “Folha de S. Paulo”.
O valor é um corte de 48,5% em relação ao orçamento de 2020 aprovado pela Lei Orçamentária Anual (LOA), que foi de R$ 63.631.172.
O repasse é um dos dois pilares do orçamento do Inpe, que também recebe verba do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).
Embora a AEB não confirme se os valores da tabela já estejam fechados e sejam os da proposta que será encaminhada para votação no congresso no dia 31(leia mais abaixo), a possibilidade preocupa a comunidade científica.
O ex-diretor do Inpe, Ricardo Galvão, demitido por reagir a críticas do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), explica que isso implica em zerar verba para novas pesquisas.
“Eles cortaram em despesas de atividades de pesquisas. Muitas zeraram e outro projeto importante do Inpe que é o satélite cientifico, que está sendo desenvolvido, chamado EQUARS (Equatorial Atmosphere Research Satellite), que teria que aportar bastante recursos este ano e ano que vem”, disse.
O ex-diretor ainda explica que há falta de previsão de novos investimentos. “Fora esses dois satélites que já foram lançados, não se colocou nada no desenvolvimento de novos satélites”, disse.
EM ANÁLISE
A AEB foi procurada, mas não respondeu o questionamento da reportagem sobre a previsão de enxugamento no repasse. O MCTIC também foi procurado, mas não se posicionou sobre o vazamento da tabela com o projeto orçamentário até a publicação da reportagem.
Fomos informados que a tabela com a previsão não deve ser a definitiva que será submetida ao Congresso. A linha de formulação do orçamento deve priorizar o pagamento de projetos já executados ou em andamento (como os satélites Cbers 4-A e o lançamento do Amazônia, ainda nesse ano) em vez de fazer novos investimentos. A agência estuda diversificar pesquisas com outros órgãos além do Inpe, como o CNPq.
NOVO SATÉLITE
O Ministério da Defesa empenhou R$ 145,3 milhões para a compra de um microssatélite por radar que fará o monitoramento da Amazônia. O monitoramento da devastação da floresta via satélite já é feito atualmente, pelo Inpe, que é ligado ao Ministério de Ciência e Tecnologia.
O vice-presidente do Sindicato Nacional de Gestores em Ciência e Tecnologia (SindCT), Fernando Morais Santos, vê como um sinal de esvaziamento do Inpe o cenário com a diminuição no repasse de verbas pela AEB e pela aquisição do satélite pelo Ministério da Defesa.
“Corta-se verbas, não se contrata pessoal e cria-se em outro local, com outro grupo, uma atividade que é a mesma que o Inpe faz, há mais de 30 anos e faz bem feita. O simbolismo dessa aquisição de satélite é muito forte. Simboliza a destruição, o desmonte do programa espacial civil e não-bélico”, critica.
O ex-diretor do Inpe também critica a compra. “Enquanto a AEB corta os recursos do Inpe, se esses recursos da Lava Jato estivessem sido colocados no Inpe para desenvolver junto com o Ministério da Defesa um satélite de radar, seria muito mais benéfico para o país. Aparentemente o Ministério da Defesa resolveu seguir uma linha independente do Inpe”, disse Galvão.